Mapa da Violência: mais do que números sobre a morte de mulheres
Os índices apresentados pelo Mapa da Violência 2015 - Homicídio de Mulheres não revelam apenas uma estatística, mas sim a necessidade de mudança social urgente
Certos casos provam que não adianta apenas criar leis: é preciso mudar o discurso, as ações e, principalmente, lutar contra preconceitos culturais enraizados em nossa sociedade. A violência cometida contra as mulheres se encaixa neste perfil, pois continua crescendo, mesmo com a Lei Maria da Penha em vigor. Prova disso é os dados publicados pelo Mapa da Violência 2015 – Homicídio de Mulheres.
O estudo foi desenvolvido pelo sociólogo argentino radicado no Brasil, Julio Jacobo Waiselfisz, e analisa todos os dados oficiais existentes (nacionais, estaduais e municipais) sobre óbitos femininos no Brasil entre os anos 1980 e 2013. Os atendimentos médicos foram também levados em conta, o que contribui para uma leitura ainda mais completa desta realidade.
O perfil traçado como o de maior risco, ou seja, o que mais sofre agressões, é o de mulheres com idade aproximada de 18 anos e negra, tendo como cenário do crime a sua própria casa. São dados que apontam para um problema social sério, que exige uma mudança estrutural tanto com a criação de políticas públicas para transformar esta realidade quanto com a revisão da dinâmica social.
Mapa da Violência: os números
Mais de 106 mil mulheres foram assassinadas no Brasil entre 1980 e 2013, 4.762 somente no último ano analisado. A idade mais atingida por este tipo de crime é 18 anos, com grande incidência até os 30, o que representa 39% dos homicídios (2013).
Cerca de 27% dos crimes contra a mulher ocorreram no lar, quase o triplo em comparação com os homens, por exemplo. Além disso, 7 em cada 10 casos de atendimentos hospitalares o agressor foi algum parente, o parceiro ou ex-parceiro. No caso das mulheres jovens, namorados e maridos são responsáveis por 50,7% das agressões.
No próximo ano, 2016, a Lei Maria da Penha completará 10 anos. Segundo Waiselfisz, ela gerou um impacto positivo ao inibir agressões de maneira promissora no início de sua vigência, o que não durou por muito tempo segundo o estudo. Isso talvez pela falta de políticas públicas e mecanismos judiciários que a complementassem. Houve uma queda de 4,2 óbitos por 100 mil habitantes para 3,9 entre 2006 e 2007.
Situação alarmante
Em 2008 os números voltaram a aumentar em um ritmo ainda mais preocupante, o que continuou nos anos seguintes até atingir o índice de 4,8 mortes de mulheres por 100 mil habitantes em 2013. Ocupando o 5º lugar no ranking entre os mais violentos para as mulheres, o Brasil fica atrás apenas de El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia.
"Se a impunidade prevalece amplamente nos homicídios em geral, ela deve ser norma também nos casos de homicídios de mulheres. Existe certa normalidade da violência contra a mulher no Brasil", afirma Julio Waiselfisz.
E são as mulheres negras as maiores vítimas. Se entre 2003 e 2013 houve uma queda do índice entre as mulheres brancas de 10% (de 1.747 para 1.576), no caso das negras foi possível ver um avanço superior a 54%, passando de 1.864 para 2.875. Assim, morreram 66,7% mais mulheres negras do que brancas no Brasil.
"Infelizmente ser mulher negra em um país machista e racista é ser duplamente violentada. Temos que lutar contra dois inimigos, encarnamos em um só corpo o gênero e a raça que é tratada como inferior", afirma Etiene Martins, jornalista e ativista do movimento negro.
A tragédia contida nestes índices aponta para a necessidade de uma mudança urgente na estrutura social e política do país, que vai desde a discussão sobre a igualdade de direitos até à redução da impunidade dos crimes. Somente assim será possível mudar este triste quadro e tornar o Brasil um país melhor.
Copyright foto: iStock
Este documento, intitulado 'Mapa da Violência: mais do que números sobre a morte de mulheres', está disponível sob a licença Creative Commons. Você pode copiar e/ou modificar o conteúdo desta página com base nas condições estipuladas pela licença. Não se esqueça de creditar o A revista da mulher (www.arevistadamulher.com.br) ao utilizar este artigo.